Maos mágicas

    O poder da massagem nas cicatrizes resulta numa melhora considerável, tanto da qualidade quanto da elasticidade da pele. 

    Quando há uma queimadura extensa, ou mesmo uma cicatriz única (normalmente resultado de uma incisao cirúrgica), e nessa for aplicado a massagem terapêutica manual, pode-se obter resultados significativos em qualidade de pele, bem como alívio das contracoes. 

    Um porém, é que no Brasil há poucos profissionais qualificados para tais manobras, até porque os pacientes queimados normalmente chegam extremamente traumatizados e com medo de serem tocados e sentirem dor.

   Outro ponto importante, o controle da dor, no Brasil o controle da dor é substimado, os pacientes nao tem a analgesia necessária para passar pelo processo de forma menos traumática possível. Morfina nao foi feita apenas para pacientes em fase terminal de câncer, mas sim também para quem tem grandes feridas. E sedacao é fundamental para manter a estabilidade emocional e integridade física, afinal das contas, dor gera estresse, estresse esse que atrapalha na cicatrizacao.

   Voltando à massagem terapêutica, é um processo simples, entretanto tem uma eficiência enorme, basta que as cicatrizes sejam alongadas  e distendidas ao máximo, para que o colágeno se alinhe, e o resultado é imediato, sendo que se isso for repetido por várias semanas ou até mesmo meses, a diminuicao nas contracoes é visível, além da textura da pele melhorar, e muito. Com essa melhora os cremes passam a ser melhor absorvídos e a coceira (prurido) diminui.

   Com uma técnica que nao exige grandes recursos materiais, somente o conhecimento da aplicacao das maos e um bom óleo ou creme hidratante, é possível obter uma melhora da pele.

Os dias que eu choro

     Tudo que eu sempre quis foi ser normal, mas isso nunca fez parte da minha vida, em nenhum momento eu tive a família normal, e depois dos meus nove anos eu passei também a ter uma pele que era tudo menos normal.

      Eu já chorei tanto por causa disso que nao sei mais precisar o quanto de lágrimas já derramei, por vezes pela dor física, que me acompanha há 27 anos, mas principalmente pela dor psicológica, nao consigo imaginar que um dia ela terá fim.

     Por mais tratamentos e cirurgias que eu faca, nunca em nenhum momento minha pele adquiriu o aspecto de pele normal, tudo que eu consegui foi uma melhora funcional e mais algumas cicatrizes discretas. Até hoje eu nunca consegui ficar verdadeiramente feliz por ter feito um tratamento, porque eles nunca me devolvem a normalidade, eles nao me fazem olhar e ver que a pele está íntegra e sem nenhum sinal de todo o horror que já passei.

     Meu maior sonho sempre foi usar as roupas que eu tivesse vontade, sem que isso me fizesse olhar no espelho e refletir que aquilo estava feio, eu nunca consegui ver beleza nessa pele deformada e quando eu penso nisso as lágrimas molham meu rosto.

    Entretanto a maior dor vem da falta de apoio daqueles que estao tao próximos, da família, é muito triste perceber que sua própria família nao enxerga a razao da sua dor, o motivo pelo qual sua vida é um martírio constante, a razao pela qual você tem vontade que seus dias nunca mais recomecem.

     Quando se está num hospital e vem mais uma cirurgia complicada e que nao vai te retornar à normalidade, tudo que se deseja é morrer, e a morte nesses casos nao é castigo, é prêmio.

     Nunca teve um único dia em que eu nao sentisse dor nas minhas costas e nos meus ombros por conta das contracoes e do encurtamento dos músculos e nervos.

     Quando eu tinha 12 anos minha casa foi invadida por um fugitivo da polícia, e ele apontou uma arma para a minha cabeca, e eu disse: "atira seu filha da puta, acaba logo com o meu sofrimento, faca esse favor". Ele nao teve coragem e baixou a arma e o policial que estava o perseguindo o prendeu.

     Eu já tentei suicídio por 2 vezes, e nao tive sucesso, uma vez eu me injetei insulina, uma quantidade tao grande, que seria suficiente para derrubar um cavalo, e nao aconteceu nada, eu só dormi e acordei com dor de cabeca, como que numa ressaca. Até hoje eu nao compreendo como isso aconteceu. Na época eu tinha 16 anos. Eu tinha pesquisado e sei que altas doses de insulina levam à hipoglicêmia e ao coma, e como ninguém iria perceber, porque era de noite, iam achar que eu estava dormindo normalmente e no dia seguinte eu estaria morta por falta de glicose no cérebro. Eu me injetei, na época mais de 30 ml de uma única vez, que corresponde à 30000 UI. Como nao funcionou e ninguém percebeu nada, nunca mencionei o episódio para alguém da família.

     A segunda vez, eu tomei rivotril, eu consumi de uma única vez 100 comprimidos, ou seja uma dose de elefante, e que seria capaz de matar qualquer ser que eu conheco, exceto eu mesma. Assim como no dia da insulina, só me fez dormir e nada mais, acho que foi a única noite que eu dormi pesadamente em minha vida.

     Eu só queria acabar com todo o sofrimento, eu queria nunca mais sentir dor, acho que esse dia nunca vai chegar.

     Nao importa o que eu faca, eu nunca me senti livre, plena e normal. A normalidade seria o maior presente que eu poderia receber em minha vida, eu queria me olhar no espelho e nunca mais ver cicatrizes. Mesmo que isso fosse por apenas um único dia, se eu tivesse esse dia, seria o dia mais pleno e feliz da minha existência. Aí sim eu poderia morrer em paz.

O valor do amor

Como amanha é domingo de páscoa, aproveite para refletir sobre o amor, e a páscoa representa o renascimento, que seja o renascimento do amor.

O ser humano na sua essência é sedento de carinho, afeto e amor. Todos desejamos ser amados desde o momento da nossa concepcao. Há uma demanda reprimida de amor genuíno em nós, queremos amar e sermos amados em altas proporcoes. Quando a família oferece esse aporte de carinho, normalmente seremos seres humanos bons e com valores bem estruturados. Porém, amor e carinho nao sao sinônimos de fartura material, querer comprar os sentimentos oferecendo em troca coisas nao vai ajudar a formar um caráter sólido e maduro. Essa relacao vai aumentar a sede de carinho e a sensacao de que ter é a medida do amor. Isso tanto nao é verdade, que quanto mais os pais oferecem bens aos filhos, mais estes demonstram necessidades, necessidades artificiais.

O que os filhos mais desejam é amor verdadeiro, esse sentimento nao é necessário investir valor monetário algum, tudo que se precisa é de tempo para se aproximar dessa crianca e adentrar no seu mundo, esse amor se demonstra com tempo, paciência, afeto e perdao, nunca com objetos e passeios. Pense calmamente em quanto do seu tempo você está investindo para comprar coisas para seus filhos, será que nao seria melhor investir uma parcela desse tempo em atividades com seu filho? Uma tarde no parque, soltanto pipa, tem muito mais valor afetivo que uma tarde no shopping center, que além de custar menos, vai aproximar mais vocês e demonstrar amor.

Amor nao é uma relacao de consumo, amor é uma relacao de troca de sentimentos e de auto-conhecimento, é uma jornada para o mundo da esperanca, é o caminho para a paz interna.

Filhos que recebem amor e ternura, sao adultos mais seguros, mais maduros e confiantes. Uma relacao baseada em amor, diálogo e respeito, vai resultar num adulto que lida melhor com as pessoas, que as trata de forma equalitária, será genuinamente um líder, porque o amor dá a lideranca, sem que isso vire opressao.

Sempre que tiver um problema com seu filho, sente e converse mansamente, explique os motivos daquela acao ser errada, as consequências e provavelmente seu filho entederá que aquilo é errado e nao fará aquilo novamente, quando se conversa calmamente e abre aquele momento para o diálogo, explicando o porquê, e em caso de punicao (castigo), também explicando a razao daquilo, a crianca entenderá que a atitude nao foi correta.

Obviamente que chegar a esse ponto nao é fácil, requer auto-domínio, amadurecimento, muita tolerância e acima de tudo amor.

Como exercitar o amor? Comece consigo mesmo, aprenda a admirar em você mesmo o que há de melhor,  aceite aquilo que nem sempre se pode mudar e pense em como você gostaria de ser tratado no seu dia-a-dia. O mundo ao seu redor irá ter outra energia. Tudo irá ficar mais bonito e mais leve quando você estiver exalando amor, e nunca se esqueca que amor distribuído sempre retorna em mais amor.

O amor e a cicatriz.

     Iniciar um relacionamento afetivo nunca é fácil, mas quando se tem cicatrizes no caminho o desafio é ainda maior, antes de conhecer a personalidade vem o julgamento da aparência, e neste caso as cicatrizes sao um grande empecilho. A sociedade, em especial a brasileira, tem um juízo muito agucado das percepcoes físicas. Nao sobra muito espaco para mostrar sua personalidade.
    Antes mesmo de te ver como pessoa, já estao te julgando como monstro deformado, sao de uma superficialidade assustadora. Até mesmo no ambiente familiar.
    Entrar na adolescência sendo portadora de cicatrizes na regiao do rosto tornou a minha vida um mar de tortura, nao foram poucas vezes que tive que lidar com conversinhas e buchichos. Entretanto, o pior é quando um garoto fala na sua cara que jamais vai querer estar ao lado de um monstro deformado como eu.
     Tive poucos relacionamentos com brasileiros, e me arrependendo até o último milímetro da minha existência por cada segundo desperdicado com eles. Depois que comecei a me relacionar com europeus e americanos descobri uma nova vida, descobri um tipo de pessoa super interessante, aqueles que se apaixonam pela sua personalidade, e isso é tao legal. Te abrem portas de uma nova dimensao da vida, na qual tudo passa a ter brilho e cor, e você se sente bela, atrativa, viva!
      Estou há mais de uma década junto com o homem com quem me casei há 6 anos atrás, e em nenhum momento minha cicatriz teve a mínima importância no nosso relacionamento, ele gostou da minha pessoa, do meu eu e isso comecou a cicatrizar e curar muitas feridas abertas que eu tinha na alma. Ele foi um presente maravilhoso, que me deu um brilho todo especial ao meu ser, que me deu coragem para tratar tanto a pele quanto a minha mente.
     Gracas a esse homem todo especial, eu tive coragem de retornar às cirurgias e tratamentos para melhorar a minha pele, nao pelo sentido estético, mas pela funcao, ele nunca quis me ver sentindo dor. Por ele, perceber que minha alma sangrava, me acompanhou e teve paciência para esperar o meu tempo para que eu voltasse à terapia, que foi fundamental no meu desenvolvimento, por isso hoje eu posso escrever. Porque muitas feridas foram fechadas. Minha alma nao sangra mais.
    O amor salva, a falta dele mata, lentamente, mas mata.

Zetaplastia, recurepando movimentos

      Quando se há uma queimadura extensa, um dos procedimentos que normalmente devem ser feitos nas regioes de contracao é a zetaplastia, é um procedimento cirúrgico que visa diminuir a tensao na regiao operada, com isso aumenta a liberdade de movimentos.
       Ela pode ser bem pequena ou mesmo em grandes extensoes como essas aqui. É um procedimento que altera e muito a mobilidade. Sua execucao requer ambiente hospitalar, mas em comparacao com outras cirurgias que sao feitas para a melhora das cicatrizes, é de menor complexidade, automaticamente de menor custo. Porém, o cirurgiao tem que ser habilidoso para obter os melhores resultados possíveis.
      Como há uma recuperacao de movimentos e dependendo da regiao, especialmente na face, há uma melhora imediata e perceptível, obiamente nao é a cura para nenhuma cicatriz, é uma técnica para recuperar mobilidade e funcionalidade.
       Quando se trata de queimaduras extensas com contraturas, nao se pode imaginar solucoes rápidas e simples, mas sim uma combinacao de técnicas e estratégias para melhorar a textura e elasticidade da pele, como recuperar movimentos e funcionalidade.
      Converse com seu médico, seja ele atendendo  no SUS, rede privada ou plano de saúde, porque sempre há uma forma de melhorar o aspecto da cicatriz. Nao desista, a cada ano as técnicas avancam e podem trazer novos recursos.

A importância da malha de compressao

     A malha de compressao (compressoterapia) tem por objetivo limitar o crescimento cicatricial, o que vai acabar determinando a qualidade da cicatriz no futuro. Do momento em que se inicia a cicatrizacao até a maturacao da cicatriz é um processo de mais ou menos 2 anos, portanto é recomendável nesse período o uso da malha de compressao.
    Quando há uma grande queimadura, especialmente de uma grande área é de importância fundamental o uso da malha, ela tem a funcao de evitar a formacao de cicatrizes hipertróficas e quelóides. Nao que será 100% evitado, de forma alguma, seria maravilhoso se assim fosse, mas nao é. A malha exerce uma forca compressora contra a cicatriz, é como se nao tivesse espaco para que as cicatrizes hipertróficas ou queloídes crescam.  Isso vai acabar limitando a producao excessiva de colágeno nessa regiao, com isso a cicatriz obtém uma melhor qualidade de tecido.
     O uso regular da malha em combinacao com outras terapias pode reduzir significativamente a quantidade de contraturas, e com isso diminui o número de cirurgias para reducao das contracoes.
     Porém, um ponto importante é que a malha tem que ser usada quase que 24 horas por dia, o ideal é retirar apenas para tomar banho. Também é ideal que se tenha 2 malhas, pois enquanto uma é usada a outra é lavada.
    As fibras elásticas da malha sao bem sensíveis aos saboes e temperatura, portanto ela deve ser lavada à mao, em água fria e com sabao de coco ou neutro. Nada de sabao em pó ou amaciante, isso altera as fibras elásticas. E secar à sombra. Com esses cuidados a malha dura mais e funcionará com maior eficácia.
     A maior dificuldade para o uso da malha é o desconforto, afinal é se sentir apertado o tempo todo. Quando o paciente é crianca há uma necessidade dos pais compreenderem a necessidade do uso da malha e com muita paciência e carinho convencer os pequenos a usarem a malha.
    Quando está quente, compressas frias, compressa em gel, auxiliam no desconforto, basta aplicar as compressas nas regioes que mais cocam e ardem.
     Hoje em dia há malhas para a regiao do pescoco que tem umas sementes dentro, formando como se fossem anéis, e com esse formato o uso do colar cervical é dispensado, o que tomar um pouco mais confortável, principalmente para dormir.

Minha experiência com as cicatrizes: As cicatrizes e a depressao

Minha experiência com as cicatrizes: As cicatrizes e a depressao:       Nao existem estatísticas sobre o assunto, nao numericamente falando, mas posso afirmar que no mínimo 99% das pessoas que tem cicatriz...

As cicatrizes e a depressao

      Nao existem estatísticas sobre o assunto, nao numericamente falando, mas posso afirmar que no mínimo 99% das pessoas que tem cicatrizes em algum momento se sentiram profundamente deprimidas por causa delas.  Cicatriz é algo que mina sua auto-confianca de uma maneira catastrofal, é como jogar uma bomba na sua seguranca. Já disse anteriormente que a pele é nosso meio de comunicacao com o mundo exterior, porém com cicatrizes a comunicacao fica prejudicada.

     Se sentir rebaixado com a sua posicao é normal, mas nao é saudável, porque isso causa uma tortura psicológica constante. Isso gera a constante necessidade de aprovacao alheia, e seu comportamento passa a ser vinculado à aprovacao alheia. Porém, um ponto ainda mais importante pauta a vida de quem tem cicatrizes, como escondê-las o tempo todo. Quem as têm quer a todo custo camuflar ou cobrir a parte lesada do corpo. Entetanto, como se faz quando as ciatrizes sao no rosto? Muitas vezes, ou melhor dizendo a maioria das vezes nem mesmo maquiagem é capaz de disfarcar.

    
 Isso gera muita dor e desconforto e vai diminuindo o convívio social, vai gerando o isolamento e isso cria o efeito bola de neve. Isolamento, diminuicao da auto-estima, que gera ainda mais isolamento e por fim leva a estados depressivos. 

     Todo esse estresse tem consequências físicas, isso altera a química do cérebro, diminui drasticamente a serotonina,  que leva à outras formas de compensar a falta de bem-estar, que podem ser o abuso de comida, álcool, drogas, medicamentos, sexo, ou qualquer outra forma de se conseguir aumentar os níveis de neurotransmissores.

     Aí há quem vá dizer faca esportes, em tese é a solucao mais óbvia e de melhores resultados para reequilibrar a química do cérebro, mas como se expor quando a fobia social vai tomando conta, e quando o desanimo é tao grande que quase nem te permite levantar da cama? Isso requer um esforco monumental, que já é grande para quem está bem, agora imagine para quem está mal?

     As pessoas que estao próximas tem um papel fundamental na identificacao dos estados depressivos. Quem está mais perto tem ferramentas para perceber o quao grave é o estado de depressao e encaminhar para um servico especializado para o tratamento da depressao.

     A depressao pode levar ao suicídio em estados avancados, nao é uma doenca que pode ser subestimada, mas é uma doenca tratável e de prognóstico favorável.

    Portanto, quando perceber que sua aparência e cicatrizes te incomodam a tal ponto de evitar o convívio social é hora de buscar ajuda de um psicologo e de um psiquiatra, pois o problema está mais severo que aparenta, e quem da família notar esse isolamento social, por favor tente ajudar o mais breve possível.

Como viver com as cicatrizes da queimadura e da acne severa?

      Essa é uma resposta muito difícil, porque a perda da pele normal é a perda da identidade, nossa pele é uma grande parte de nós, é nosso primeiro meio de contato com o mundo exterior. Após uma grande queimadura, ou até mesmo uma acne severa, a confianca e a auto-estima caem a níveis abaixo de zero. Pois, antes com tudo normal já haviam insegurancas e desconfiancas a respeito da própria imagem, o que dizer agora que tudo está deformado? Deformado, exatamente, é uma palavra muito forte, mas é a que define como a pele fica após uma queimadura profunda ou acne severa.  Como lidar com isso?

      Primeira coisa é aceitar que algo nao está funcionando como deveria, ou seja, a sua pele e a sua cicatrizacao, cicatriz é uma marca que nao é agradável de ter e muito menos de apresentar. A partir do momento que se identifica que algo nao está como deveria é procurar por ajuda profissional. Porém, fique certo que a jornada nao é curta e nem rápida, contudo é possível, independente do grau de deformidade é sempre possível melhorar o aspecto da cicatriz e em alguns casos até praticamente acabar com elas. Tudo vai depender da extensao, profundidade e quais tecidos também foram afetados. Nao é o fim do mundo!

     Se seu caso for acne severa, procure inicialmente um dermatologista, a primeira estratégia é controlar o surto, somente depois disso controlado é que se pode pensar em como amenizar as cicatrizes.

     Entretanto, se o seu caso é como o meu, cicatrizes de queimaduras de 3° grau, sem comprometimento de estruturas nobres (olhos, órgaos internos, ossos e músculos) é necessário e fundamental o acompanhamento com cirurgiao plástico para decidir quais as estratégias de tratamento a serem tomadas. Elas irao incluir, zetaplastias, wplastias, expansao de tecido, enxerto, malha de compressao, estimulacao por microcorrente, laser, derma roller, ácidos, re-cell, fisioterapia e mais uma paleta de tratamentos. Pois todo tratamento depende muito da área comprometida, e com todos esses recursos as lesoes podem ser melhoradas, nao se pode falar em remocao completa, mas em qualidade superior de tecido e melhor funcionalidade.

     Por favor, busque ajuda psicológica, é necessário tratar os seus medos, traumas, desajustes, insegurancas, enfim, tudo que está relacionado a como você sente o mundo, pois quanto mais fragilizada for sua posicao, mais difícil será olhar de frente as pessoas e nao se sentir intimidada, que por muitas vezes faz te ficar paranóica e se sentindo rebaixada. Nem sempre as pessoas estao te enxergando como uma grande cicatriz, você é muito mais que isso. Aprenda que se você tiver algo a mais a oferecer numa conversa ou relacionamento, as cicatrizes podem chamar a atencao num primeiro momento, mas com o passar do tempo as pessoas nao vao mais prestar atencao nisso e sim em você como essência, como pessoa, como ser humano.

      A ajuda dos profissionais da psicologia é tao importante, porque eles podem te auxiliar a enxergar o mundo com outros olhos e resolver os seus traumas, pois você é muito mais que apenas a sua pele.

     Tente ter atividades normais, vá para a escola, faculdade, trabalho, balada, enfim, tente fazer tudo aquilo que você faria normalmente, pense que tudo aquilo que você pode fazer sem cicatrizes, você também pode com cicatrizes.

     Eu demorei muito a compreender tudo isso, muitos anos, muitos mesmo, eu tive muito medo, muita inseguranca, mas de alguma forma acabei fazendo tudo, fui para à escola, faculdade, trabalho, balada, namorei, casei (só nao tive filhos, por escolha própria), enfim uma vida normal. Claro que isso me custou nervos, lágrimas e coragem. Coragem esta que até hoje eu  nao sei de onde eu tirei. Houve muitos momentos em que eu quis simplesmente nao acordar mais, nunca mais me sentir daquela forma, mas como existia um novo dia, eu acabava arrumando forcas e indo fazer o que era necessário e assim acabei tendo uma vida relativamente normal.

      Nem sempre a família e os amigos irao compreender a sua dor e angústia, porque sao suas e nao deles, inicialmente pode até haver algum entendimento, mas passado um primeiro momento, as pessoas passam a nao entender como você consegue sofrer tanto e por tanto tempo pelas mesmas coisas. Disso eu entendo e muito bem, porque tem mais de 20 anos que meu acidente aconteceu e com frequência eu recebo essa pergunta, por que eu ainda me preocupo com as minhas cicatrizes. A resposta é simples, porque elas ainda estao aqui  e eu as vejo diariamente.

      Seria muita hipocrisia da minha parte dizer que nao há dias que me sinto totalmente triste por tudo que aconteceu, porque eu sinto, mas por outro lado, aprendi que tenho que fazer a vida prática funcionar e ninguém vai parar para enxugar as minhas lágrimas.

      Quando a dor for tao insuportável que você nao consiga nem sair da cama, é sinal que você está precisando muito de ajuda profissional, se você nao conseguir superar isso com as próprias forcas talvez seja necessário terapia, antidepressivos, grupo de ajuda. Qualquer coisa dessa natureza, mas nunca, jamais o álcool ou drogas, aja vista que num momento de fragilidade emocional desses é um convite para a estrada sem volta.

      Sua vida é preciosa e ela tem um mundo de possibilidades, você ainda pode ser um grande profissional, um pai ou mae maravilhoso(a), pode se relacionar com pessoas, pode ser um amigo valioso, enfim, sua vida nao chegou ao fim por causa das suas cicatrizes. Acredite lutar vale à pena.

PS. Nao consegui acentuar com cedilha e til.

     

meu ombro

O dia do acidente

     Como já relatei anteriormente meu acidente foi dia 29 de janeiro de 1988. Fui inicialmente atendida no posto de saúde que era bem próximo à minha casa, O enfermeiros colocaram um lençol embebecido em soro fisiológico sobre as lesões e um cobertor nas minhas pernas, colocaram um respirador, assim como acionaram a ambulância dos bombeiros, que imediatamente me transportaram para o Hospital Evangélico de Curitiba, tudo muito rápido, meu acidente foi às 8 em ponto da manhã e às 8:29 eu já estava na ala de queimados. Esses profissionais salvaram a minha vida, pois o pronto atendimento é crucial nesses momentos. Os primeiros cuidados serão decisivos na manutenção da vida e no prognóstico das cicatrizes. Portanto, apenas resfrie a lesão com água corrente fria e vá imediatamente para um serviço de saúde, preferencialmente para o setor de queimados da sua cidade.

     Era um dia muito quente, e passado o choque inicial, eu me vi dando informações sobre o ocorrido para os médicos, o meu na época era o Dr. Luiz Henrique Calomeno, e fui enfaixada e colocaram soro e plasma para eu receber de forma endovenosa, acho que antibiótico também. Apesar de eu ter todas as vacinas em dia, eles me deram a antitetânica na hora. Cortaram o resto de cabelo que eu tinha, afinal estava tudo queimado, inclusive meus cílios, sobrancelha, só não queimei as unhas, minhas mãos tiveram queimaduras de 1° grau.  Tive aproximadamente 30% do meu corpo queimado, o que para uma criança representa um risco potencial de morte.

    Aqui na Alemanha, o procedimento padrão seria induzir ao coma, até mesmo para não se criar o trauma da dor, mas não foi o que eu recebi na época, espero sinceramente que isto tenha evoluído.

    Eu recordo de sentir muita sede, e a única vez que me deram um copo de água nesse dia provocou muito vômito, e com isso tiveram que trocar os curativos, logo depois disso comecei a sentir meu rosto inchando, creio que em no máximo umas 2 a 3 horas após o acidente, eu mal conseguia abrir os olhos, eu respirava com dificuldade, afinal meu nariz e vias respiratórias estavam lesadas, eu tinha um suplemento de oxigênio, mas eu ainda assim sentia muita dificuldade em respirar, e com isso começou a confusão mental, eu tinha a sensação de estar peregrinando no inferno.

     Eu acredito que perdi os sentidos por alguns momentos, eu via um abismo, e me sentia cair nele, deve ter sido a hipóxia, afinal eu não conseguia respirar direito, o inchaço era imenso, naquele dia, nem meu pai que foi ao hospital me reconheceu, meu rosto estava inteiro deformado, pois eu tive queimaduras de 2° grau na face, e virou tudo em bolha, lembro dos meus lábios grudarem uns nos outros, e as enfermeiras colocavam gazes umedecidas para evitar que a pele grudasse e com isso sangrasse.

     Na primeira noite, imagino que eu deva ter alucinado até o último grau, afinal eu tinha febre de 40C graus, o que já é suficiente para levar a estados convulsivantes, mas eu nao tive convulsão, apenas delírios. Eu gritava por socorro porque eu estava vendo a imagem da morte, aquela clássica como a da foto abaixo. Logo depois eu vi o túnel de luz, e senti como um choque uma dor horrível no peito.

   

Tive pesadelos com isso por anos a fio, e cada vez que eu ouvia a sirene dos bombeiros ou de ambulância eu tinha vontade de chorar, cada fibra do meu corpo se retesava.

    Na manhã seguinte eu sentia mais sede do que nunca, eu tinha vontade de tomar um balde de água, mas eu não podia por causa da chance de vomitar e desidratar ainda mais. Dia 30 era um sábado e o irmão do meu pai veio me visitar, ele passou direto por mim e não me reconheceu, aí quando ele parou em frente da minha cama e dava para ver a cara de espanto dele, ele ficou em completo choque, imagine um homem de uns 50 anos, que sempre foi muito reservado e frio, ficar pálido e sem palavras, a esposa dele, minha tia é que tentou contornar a situação, mas deu para perceber nitidamente o susto que eles tomaram.

    Recordo que a televisão estava ligada no Jornal Nacional e teve o sequestro de um avião da Vasp e o alvo era o palácio do governo em Brasília. Acho que foi daí que se tirou a idéia das torres gêmeas.

    Na época, eu já sonhava em vir para a Alemanha, porque eu queria esquiar e patinar no gelo, eu tinha verdadeira obsessão por inverno, e passou na tv algo que tinha um nevasca em Hamburgo, nesse minuto eu desliguei de tudo que estava acontecendo e pensei na neve e na Alemanha. Acho que isso acabou me trazendo para cá anos depois.

     Eu quero deixar um alerta, em especial aos pais, para que nunca deixem suas crianças desatendidas próximo a fontes que podem causar queimaduras, para acontecer basta um segundo, para amenizar, uma vida inteira.

      

Queimei e agora?

Quanto ocorre uma queimadura há alguns cuidados básicos a serem tomados, o primeiro é esfriar o local da lesão e dependendo da extensão e da profundidade deve-se procurar o serviços médicos da sua cidade ou região. Quanto à classificação compare com o link da wikipédia e aqui.
Agora relacionando ao grande queimado, após a internação, será importante estabilizar o paciente, para que este não venha a óbito, já que há vários riscos envolvidos nas primeiras horas.
Quando eu estava internada, nunca me esqueço que chegou uma menina que tinha 95% do corpo queimado, ela não resistiu, acabou falecendo naquela noite, embora as enfermeiras não falassem claramente, eu enquanto criança curiosa prestava atenção e percebi a movimentação, além da retirada do corpo dela da enfermaria. Foram poucas horas desde a chegada dela até o falecimento.
Esse foi um fato que me marcou, foi a primeira vez que vi alguém morrer.
Na minha época os pais não ficavam junto às crianças, e eram apenas 3 dias de visita na semana, totalizando 3 horas. O meu pai ia todas as vezes, minha mãe, que estava grávida foi apenas uma vez. Minhas tias também visitavam com freqüência. Tinham crianças lá cujos pais moravam no interior e nunca recebiam visitas, e minha família sempre dava atenção a elas. No fundo eu era uma privilegiada, pois eu recebia muitas visitas. 
Em 1988 o método de tratamento era outro, sei que muita coisa evoluiu desde então. 
O tratamento da dor naquela época era muito precário, se comparado com os dias atuais, tanto que eu sou traumatizada pela dor até hoje pela dor que passei naqueles dias. 
A troca de curativos era o inferno em vida, só de lembrar meus olhos enchem de lágrimas. Nenhuma sessão de tortura pode ser mais eficiente que aquilo. Espero que esse quesito tenha evoluído muito.
Um dos momentos felizes que eu tive foi quando eu finalmente pude fazer o enxerto de pele, que é a retirada de uma fina camada de pele, entre 1,5 e 2 mm e faz-se o recobrimento da área lesada. Quando tudo funciona nesse procedimento, a ferida se fecha no decorrer de poucos dias, e com isso a troca de curativos não é mais tão dolorosa. Além de que a ferida está a caminho de fechar e isso significa que logo pode ir para casa.
Apesar de ir para casa, não significa que acabou o tratamento, de jeito nenhum, agora é só o começo da jornada.
Por vários dias, acho que mais ou menos um mês e meio, eu tinha que ir regularmente ao ambulatório para trocar curativos e decidir os próximos passos, entre eles a malha de compressão, o colar cervical e depois um mar de cirurgias e aparelhos para as costas. Não esquecendo que após uns 2 meses depois de sair do hospital iniciou a fisioterapia e a psicologa, ambos eram no hospital pequeno príncipe, em Curitiba, todas as manhãs a Catarina, minha fisioterapêuta, me cuidava, das 9 às 10, depois eu tinha horário com a Cintia, minha psicologa. Eu fiquei no hospital pequeno príncipe fazendo fisio até eu completar 12 anos, essa era a idade limite, porque depois eu teria que ir para uma clínica de adultos. Acabei parando com o tratamento, até mesmo porque meus pais estavam muito desgastados com tudo aquilo, eles não tinham estrutura para suportar toda aquela reviravolta. 
Minha mãe deu a luz à minha irmã em maio de 1988. Portanto, não era fácil para ela ter um bebê, e uma filha que demandava tanta atenção. Aconteceu que eu acabei recebendo menos cuidados do que eu precisaria.
Eu tinha (e tenho) pesadelos, na época ninguém falava sobre estresse pós traumático, mas era exatamente o que eu tinha, e creio que a maioria dos pacientes desenvolve também.
Para crianças tem um grande agravante, o crescimento contribui imensamente para a formação de contraturas.
Um ponto muito importante, é que as pessoas sempre olham com cara de nojo para quem tem cicatrizes de queimadura, e pode ter certeza que isso não contribui em nada para quem já está numa situação dessas. 

O começo

Eu me queimei num acidente doméstico com gás e fogo, dia 29 de janeiro de 1988 às 8 horas da manhã, era um dia bem quente. Tive uma área de mais ou menos 30 por cento do corpo queimada, o rosto, braços e a barriga, com queimaduras de 2° grau, aquelas que formam bolhas, o tórax, axilas e parte superior dos braços com queimaduras de 3° grau. Como eu inalei fumanca e tive queimaduras superficiais nas vias respiratórias. Portanto, eu tinha grandes chances de nao sobreviver, principalmente por eu ser uma crianca na época do ocorrido.

Imediatamente fui encaminhada e conduzida pelos bombeiros para o Hospital Universitário Evangélico, em Curitiba.

Depois de 41 dias tive alta, vários enxertos de pele, várias cirurgias de debridamento aconteceram nesse intervalo.

Bom, depois que se sai do hospital vem a fase mais complicada, porque a pele tem a tendência a fazer contrações fibrosas, que sao como se fossem cordões de pele que prendessem duas regiões e restringem os movimentos.

Outra coisa importante é que nessa fase é que se inicia o uso da malha de compressao e o colar cervical (que foi o meu caso), para tentar manter a região de pescoço com o menor número possível de contrações. Com isso decaí a quantidade de cirurgias no futuro.

A malha tem como função principal limitar o crescimento da cicatriz hipertrófica, ou seja, dar um aspecto mais uniforme à cicatriz, sendo assim, futuramente a correção nao é tao complicada. Detalhe a malha tem que ser usada quase que 24 horas por dia, sendo somente tirada para a higiene. Daí advém a necessidade de ter ao menos 2, uma sendo usada e outra lavada.

Cirurgias reparadoras, quanto antes puder ser iniciado o processo de reconstrução tanto melhor. Há vários tipos de intervenções, que iremos discutir futuramente, pois cada uma necessita um detalhamento.

Acompanhamento psicológico, fundamental para reestabelecer a convivência social.

Fisioterapia, indispensável, o ideal é que seja um profissional, caso não seja possível ter um, ao menos uma consulta com um para que possa um membro familiar, ou pessoa próxima, para aprender a execução e repetir durante a recuperação.

Dentista, caso ocorram queimaduras na face e pescoço, é importante o acompanhamento do crescimento da arcada dentária, pois devido à contração pode haver subdesinvolvimento das arcadas.

Enfim, todo paciente que sofreu queimaduras necessita que uma equipe multidisciplinar acompanhe, para que assim se possam minimizar os danos causados.

Segue um vídeo mostrando um pouco desse atendimento no Hospital Evangélico de Curitiba.

https://www.youtube.com/watch?v=0VdBcbENovs

O primeiro post

Após várias buscas na internet, percebi que não há um conteúdo escrito por quem tenha passado pela experiência e tampouco relatos de práticas e tratamentos.

Eu venho aqui relatar a minha experiência, bem como abrir um canal para que as pessoas possam saber mais sobre os efeitos físicos e psicológicos da vida pós queimadura.

O meu foco será o queimado de grande superfície, porém, isso pode ajudar muitas outras pessoas com outros tipos de cicatrizes e os queimados de pequena superfície.

O primeiro passo é saber como estabilizar e dar primeiros socorros ao paciente, e encaminhar ao serviço de queimados da sua cidade ou região mais próxima.

A primeira batalha começa, agora à partir desse momento é crucial manter a vida do paciente, porque em razão da grande perda de líquido e exposição tecidual, há uma desidratação profunda. Outro ponto, é que dependendo da fonte que causou a queimadura, serão táticas diferentes de tratamento.

Passado essa fase crítica de luta pela vida, aí sim começa a verdadeira batalha. Agora a vida não será mais a mesma... Iniciam-se as dores físicas, as contrações teciduais e o flagelo mental.

Desse momento em diante começa sua jornada pelo inferno.